quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

O sábio ato de podar



                                                  
     Na jardinagem, a poda é concebida como uma prática necessária. É um corte grandemente positivo, uma ação que recorta da planta suas partes mais velhas ou fracas ou em excesso e, assim, viabiliza renovado crescimento.

    Nós, seres humanos, temos o incrível talento de complicar o simples, deixando de enxergar o claro e óbvio. Se nos lembrássemos de descomplicar, perceberíamos que temos muito a aprender com as outras vidas que dizemos ter “domesticado”, como os animais e as plantas. Com estas, por exemplo, podemos ver o viçoso efeito que uma poda bem feita pode causar.
  
      Pois, é mesmo importante aparar - não só espinhos, mas também as flores cujo botão já abriu-se em esplendor e decaiu-se em desgaste. Sem isso, a planta não vai para frente, a gente não vai para frente. É preciso cortar os excessos, os acúmulos que nos amarram, que nos empacam, para que possamos progredir. É essencial convidar o inesperado que traga suas belezas e surpresas ao desamarrar-se um pouco do planejado, permitir que a nova temporada de flores venha ao abdicar da velha.

      Às vezes, a gente tem dificuldade de desapegar. Desapegar, desapontar, dizer “não”, dizer “basta”, dizer “adeus”. Porém, passado o parto inicial de fazê-lo, a dor ardida e pontada que parece nos atingir no momento, quase sempre nos damos conta de que esta era mesmo a melhor coisa que podíamos fazer. Que nós nos libertamos, não só do que necessariamente nos fazia mal, mas também o que nenhum bem fazia ao somente ocupar espaço e assim nos impedir o movimento, a abertura mais larga de horizontes, a dilatação de fronteiras, o encontro com o novo que estava ali, apenas na esquina, nos esperando.
  
     Em suma, meus amigos, podemos. Podemos dores que vem se arrastando metálica, fria e barulhentamente como correntes. Podemos amores que não correspondem, que não valem a pena, que mais fazem sofrer do que sorrir. Podemos amigos que não mais nos amigam, ou que querem nos amigar a caminhos que não queremos seguir.

     Podemos tralhas que atravanquem o guarda-roupa, livros que não leremos mais, roupas cujo vestir incomoda. Podemos tudo o que está embrenhando a nossa vida. Deixemos que o chão limpo, a terra fecunda, os galhos renovados e fortes nos tragam floradas mais brilhantes, façam o sol entrar sem limites e sem ressalvas.

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