quarta-feira, 29 de julho de 2015

Falando de sonhos

                                 
                                                                                                  
    Sonho. Já perceberam como essa é uma palavra que não usamos muito? Parece que temos um certo receio de dizê-la em voz alta, ou de dizê-la simplesmente. No sentido de uma aspiração, objetivo, é claro. Tem gente que prefere “meta” ou “plano” porque, dizem, assim o projeto parece mais real. Tem gente que prefere não utilizá-la levianamente, por tão preciosa e brilhante; tem gente que prefere não utilizá-la hora nenhuma, por considerá-la vã e tola por si só. A palavra importa porque reflete a coisa, e o modo como consideramos a primeira traduz o nosso pensamento em relação à segunda. 

    Eu sinto que estamos perdendo nossa capacidade de sonhar, em vários sentidos, − e, o mais triste, desde muito pequenos. É um grande “mico”, já na mais tenra idade, acreditar em papai noel, por exemplo; as crianças descrentes zombam da inocência daquelas que creem, e os adultos acham muito bonito espinhar essa inocência, criar pequenos que sejam, ou pareçam ser, crescidos. 

    Parece que estamos vivendo uma era em que tanto a magia quanto a perseverança estão fora de moda. As pessoas preferem ser vistas como realistas (apáticas), ou pessimistas (descrentes), que tem os pés no chão (incapacidade  de lutar pelo que querem ou acreditam) e só consideram para si e seu futuro cenários não muito desafiadores que julgam adequados à sua realidade (pequenez). 

    Stephen Chobsky disse “nós aceitamos o amor que achamos que merecemos”. Eu digo que nós aceitamos os sonhos que nos achamos capazes de realizar. Quem não acredita nos seus sonhos é porque não acredita em si mesmo.

    Além da realização de um sonho em si, o que está envolvido nisso também é antes a capacidade de sonhar, muito inerente ao ser humano - aquele que enxerga e incorpora o encanto que existe em viver, encanto tão simples mas tão belo que não devemos perder, não podemos deixar morrer ou esvair-se. Quem vive sem sonhar é pior que um fantasma, um mero cadáver, porque o primeiro pelo menos vive por um sonho.

    Quanto aos sonhos em si, eles merecem apreço e atenção por si próprios também, e não só por serem indicativos da capacidade de alguém de sonhar. Pois, quem tem o direito de desmerecer o sonho do outro? Quem tem o direito de ridicularizar a mais cara ambição de outro alguém? Quem pode convenientemente se deixar esquecer e se esquecer de lembrar o seu próximo de que é impossível começar do topo, e quem está lá chegou porque, primeira e principalmente, no início e ao longo todo do caminho, acreditou?

     Se existe uma espécie de ser humano de que eu particularmente não consigo gostar é aquele que faz do sonho do outro (e de todos os quase sempre custosos passos envolvidos em conquistá-lo) motivo de riso, menosprezo, deboche. Aquele que desfila destilando pessimismo e uma muito estúpida sabedoria que vê em “cair na real”, tentando falar a todos em sua volta que “caiam” também.

    Até pouco tempo atrás, eu tinha uma raiva ardente dessas pessoas. Hoje, porém, eu entendo algo que transformou essa raiva em pena: aquele que tenta descreditar o sonho do outro o faz porque nunca acreditou no seu próprio. Aquele que diz soberbo ao outro que “acorde para a vida” e largue de “ser bobo”, desista das suas “fantasias” o faz porque teve seus próprios sonhos frustrados em ilusões, interrompidos antes mesmo do ponto de partida.

    Eu não tenho pena de quem sonha, mesmo quando sonha um sonho improvável, um sonho que pareça impossível. Eu não tenho pena de quem tentou, tentou, fez tudo o que pôde e não realizou plenamente o seu sonho, mas o viu partido. Eu tenho pena é de quem não ousa sonhar.

    Eu tenha pena de quem se acomoda, de quem se contenta, de quem se conforma. Tenho pena de quem não se perde imaginando e antecipando o que quer viver, se encontra construindo esse caminho, e é feliz nos dois momentos. Tenho pena de quem não se arrisca e faz escolhas buscando a segurança, rejeitando a aventura, deixando seus sonhos para trás por medo do fracasso. 

    Pois, o fracasso faz parte do sucesso; e é muito raro o caso de quem experimentou a doçura da vitória sem ter provado primeiro, em algum ponto, o amargo da derrota. Aquele que não se atreve, não ousa, que se acha alto demais para rebaixar-se às pedras do caminho, submeter-se às intempéries da jornada, aos primeiros passos que não raro são pequenos, aos grandes passos que raramente rendem de imediato todo o sucesso esperado, esse sim é um ser pequeno, e nunca chegará ao topo. Nunca saberá a satisfação de ter escalado cada centímetro da montanha para chegar a seu cume, nunca conhecerá o riso que vem da lembrança de cada um obstáculo enfrentado depois de tê-los todos superado. Nunca poderá respirar fundo, suspirar pleno e sorrir, dizendo “sabe, estou feliz por ter realizado o meu sonho hoje”.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Medo de quê?

                                                                      
 
    Todo mundo tem medo de alguma coisa. Pode tentar esconder, pode negar e negar, mas é muito provável que tenha algum grande medo, e isso não é motivo nenhum de vergonha. É natural, normal do ser humano sentir medo; anormal é não sentir.

    Eu acho quase incrível a capacidade que o ser humano tem de magoar o outro, desrespeitar o outro, e também incrível como a maioria das pessoas não deixa de usar desse seu poder sempre que tem a chance. Essa babaquice, tão desnecessária, normalmente me incomoda bastante, mas às vezes chega a níveis tão extremos que chega a ser franca maldade, e isso muito me enraivece.

    Uma das ocasiões em que a babaquice vira maldade é quando rimos dos medos dos outros. Rimos, debochamos, fazemos graça de algo que para alguém não tem a menor graça.

    Conheço uma pessoa que tem medo de cachorro. Não sei se ela passou por alguma espécie de trauma envolvendo cachorro, mas o fato é que sempre que vê um perto, mesmo que ele esteja em paz, ela trava. Paralisa mesmo, treme, não consegue sair do lugar, reagir de forma alguma, fica aterrorizada. O cão precisa se afastar, ou ser afastado, para ela recuperar posse de si mesma, sair desse estado de medo e terror. Não tem a menor graça.

    Tem gente que tem medo de bicho - sejam cavalos, galinhas, aranhas, cobras, gatos ou cachorros. Tem gente que tem medo de estrada, ou de ficar sozinho. Tem gente que tem medo do próprio poder de ferir-se. De chuva, raios e trovões, de água, de fogo, do mar. Tem gente que tem medo de voar. Tem gente que tem medo do medo, medo de ousar, de fazer diferente. Medo de não ousar, de jamais arriscar, de não acreditar. Tem gente que tem medo de ser o que é, tem gente que tem medo de ser o que não é. Tem gente que tem medo de morrer, tem gente que tem medo de viver... 

    Todos temos nossos medos, e ao invés de rir dos medos dos outros, devíamos pensar que alguns dos nossos medos podem parecer a outrem tão bobos quanto os deles parecem para nós, e que nem por isso eles nos são menos reais ou merecem ser menosprezados. Devíamos tentar nos colocar no lugar do outro e entender o que ele está sentindo.

    Eu tenho, entre outros, dois grandes medos, muito fortes e muito meus, com os quais, acredito, ninguém pode me ajudar. 

    Tenho medo de não ter propósito, e mais que isso, não ter serventia. De levar uma existência sem sentido e sem valia. De sentir - e ter confirmado esse sentir - que minha vida não vale a pena, porque eu não valho a pena, e não acrescento, não agrego em nada, não tenho contribuição nenhuma a fazer, pois o que eu faço não tem valor, não é significativo, não faz nenhuma positiva diferença. De não ser importante, de ser inútil, de ser... vazia. 

    Tenho medo de cidade grande. Tenho medo do trânsito que costumo encontrar nesses lugares, do tamanho, do caos, do avassalador poder que ela tem de me fazer me sentir pequena. Da violência, do não poder confiar nas pessoas que estão ali, por não conhecê-las e não ter a chance de fazê-lo, do quanto me sinto sozinha e desamparada, descartável e vulnerável, quando estou num lugar que assim comumente pode ser descrito. É horrível, para mim, estar numa cidade grande. Especialmente se eu estiver sozinha, sinto muito medo. 

    Pelo menos, esse é um medo que, ao contrário do primeiro, não me paralisa e me corrói, mas me move, me move a - normalmente, quando estou (tenho que estar) num desses redutos de cosmopolitice gigante - fazer tudo o que eu tenho que fazer ali da forma mais rápida possível, e em seguida, partir na mais temprana hora da rodoviária conveniência.

    Parece engraçado? Confesso que é um pouco engraçado para mim também - enquanto estou aqui, no encantado sossego de minha cidade pequena. Mas, não ria de mim, leitor, e não me largue sozinha numa cidade grande, que eu não me sentirei segura nem feliz, eu sentirei medo - e ele não é uma sensação boa.

     Sentir medo é normal, e até um bom sinal. Ele nos é um lembrete da nossa humanidade, fragilidade, fraqueza. Antigamente, nos tempos das cavernas, o medo era uma espécie de nosso melhor amigo, ferramenta necessária de alerta do nosso instinto de sobrevivência. Hoje, pode ser que estejamos mais protegidos - da natureza, eu digo. Hoje, os medos são outros, mas nem por isso menos significativos. E só o que podemos fazer é não deixar que eles nos paralisem por completo.

    Em suma, o que eu queria dizer hoje era isto: devemos respeitar os medos dos outros, como todas as suas particularidades. Não devemos fazer escárnio deles, dispensá-los como a maior idiotice que se já se viu, a maior bobeira. As pessoas são diferentes, têm medos diferentes, e nós precisamos aprender a reconhecer e a respeitar isso. Ninguém merece se sentir diminuído por conta de um medo - que é apenas natural do ser humano e diferente, enquanto próprio de cada um. 

    Você, por exemplo. Do que você tem medo?

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Compatibilidade

     
      O que atrai as pessoas umas às outras? Ou, aliás, o que atrai uma pessoa à outra? São as semelhanças, os gostos parecidos, interesses semelhantes, modos de pensar que se lembram? São as diferenças, o que não há em um que pode ser completado pelo outro, os contrastes que se encaixam e se aliviam, o desafio de poder experimentar o mundo através de alguém completamente diferente?

    Diz o ditado (e a física) por aí que os opostos se atraem - embora esse assunto gere controvérsias.

   Particularmente, entre semelhanças e diferenças, eu fico com compatibilidade. Sintonia. Afinidade, entendimento. A capacidade de falar a mesma língua com alguém sobre alguma coisa - seja ela ponto em comum ou de divergência -, de entender o outro e viver deliciosamente com ele como ele é. De sentar para conversar com a pessoa, e a conversa fluir simplesmente...

    Compatibilidade. É ela, para mim, a responsável por levar alguém a outro alguém, mesmo antes de um encontro. Quero dizer, existem aqueles que não conhecemos para com quem somos neutros, quase indiferentes; aqueles de quem, por intuição qualquer, desgostamos (com quem não simpatizamos), e aqueles à quem nos sentimos puxados positivamente, mesmo sem conhecer muito. Isso, creio eu, é explicado pelo poder da compatibilidade.

     E é essa mesma compatibilidade, para mim, a responsável por fazer dois alguéns, depois de um bom conhecimento, se darem esplendidamente bem. É mais sutil do que semelhança e diferença, e ao mesmo tempo, algo mais concreto. É aquela coisa que, quando existe, não se percebe. É tão mágica que está ali, mas ninguém se dá conta dela. E é tão forte que, quando não existe, sua ausência é gritante. É notável, muito perceptível, catastrófica.

    Talvez, princípios da química possam explicar isso melhor que aqueles da física, porque essa dinâmica e viva harmonia da compatibilidade parece com aquele mistério das misturas. Algumas substâncias se misturam. Imediatamente, instantaneamente, sem nenhum truque ou intervenção de fora, naturalmente. Elas conversam. Algumas misturam-se de um jeito tal que é até difícil separar. Outras não se misturam, simplesmente. E não importa o quanto de cada uma você tente colocar junto, quantas vezes tentar, que elas não vão se misturar. Não vão; a coisa não acontece. Elas não conversam.

    (E se houver algum químico aí lendo-me que possa explicar o porquê dessa miscibilidade baseado em propriedades das substâncias, ou alguma outra mirabolância do além, eu sinceramente peço que perdoe a minha ignorância, e não a esclareça. Tem certas coisas que perdem o encanto quando se explica demais. É melhor deixá-las no mistério. E na metáfora.)

    Enfim, como na maioria dos assuntos do coração, e das relações humanas, eu acredito que para isso não há regra. Não existe receita, nem um padrão definido de atração e harmonia entre as pessoas. No entanto, quando não há compatibilidade, química, sintonia, é muito difícil uma relação dar certo, seja ela de qualquer natureza. E me parece evidente que, quando ela existe - seja entre semelhantes ou diferentes, pessoas tão semelhantes que parecem ser uma mesma ou tão diferentes que a princípio parecem não habitar a mesma galáxia -, existe também para essa relação um futuro. Existe conversa, comunicação, e um certo encanto. Pois, mesmo num mundo tão real quanto o nosso humano, nada floresce sem um pouco de magia, uma pitada de encanto.


sábado, 11 de julho de 2015

Into the wild

      Como prometido, aqui estou de novo com uma música. Esta é daquelas que, para mim, faz parar o coração por um minuto. Sabe quando a gente sente aquela coisa mágica de ouvir alguém cantando justamente o que pensamos, mas nunca tão bem conseguimos colocar em palavras? Pois é, esta canção é dessas para mim, já foi tantas e tantas vezes e, suspeito, continuará sendo...


                                      
                                                             
      Quem nunca se sentiu oprimido não pela falta mas pelo excesso? Pelo tanto de coisas que acumulamos, das quais nem precisamos; pelas tantas exigências que o mundo nos impõe, as tantas obrigações que estabelecemos a nós mesmos, o tanto de... tempo, precioso tempo que perdemos buscando aquilo que não vale a pena...
       Christopher McCandless - um rapaz que tinha tudo - escolheu deixar o doido mundo "civilizado" em que vivemos e partir numa jornada ao mundo "selvagem", em busca da tão rara sensação de estar vivo. Anos mais tarde, um livro escreve sua história e um filme a conta - em belíssimas imagens, impecável trilha sonora, composta por Eddie Vedder, e uma narrativa de tirar o fôlego e arrancar lágrimas. O diretor Sean Penn fez um trabalho minucioso, contando com a colaboração da família de Chris, para entregar este que é um filme excepcional, capaz de tocar de modo muito especial em algo lá no fundo dos nossos corações.
     "Into the wild" é um filme lindo, e essa música traduz um pouco da intensidade que ele e sua mensagem carregam.
     

quarta-feira, 8 de julho de 2015

O problema da curtida

                                                                    
   
    Esse vídeo tem _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ visualizações.
    E _ _ _ _ _ _ _ _ _ pessoas curtiram essa página.
    Eles devem ser bons.
  
    Quem nunca ouviu frases como essas? Agora, com as novas tecnologias de informação fazendo parte enorme das nossas vidas, com as novas “mídias sociais” inundando cotidianos de aparentemente quase todo o mundo, essas são frases que ouvimos com frequência. Irritante frequência. Tudo o que é compartilhado pode ser recompartilhado por outras pessoas, e ainda avaliado, com os tais “joinhas” que simbolizam o curtir, ou não curtir, com os comentários habilitados para todo lado - e com tudo isso podendo ser convertido em visíveis e falantes números.

    Por que isso é um problema?

    Uma pesquisa recentemente publicada pela University College London e o Centro Anna Freud, na Inglaterra, mostrou que nos últimos cinco anos percebeu-se assombroso aumento no número de meninas de 11 a 13 anos com risco e propensão à uma série de distúrbios e problemas emocionais graves, como ansiedade e depressão. E uma das principais causas de tão grande aumento em tão pouco tempo, especulam os estudiosos, é justamente o uso corrente das benditas redes sociais. Como assim?

    Podemos dizer com um grau razoável de convicção que, em termos de faixa etária, é a camada jovem da população aquela que mais utiliza as mídias sociais, que mais horas do dia passa nelas, mais intensamente ligada e envolvida nelas fica. E essa é a fase da vida em que uma pessoa está se afirmando no mundo, aprendendo a andar com as próprias pernas, delimitando a sua identidade, reconhecendo a si mesmo no seu meio em relação ao outro. É uma fase de transformações e inseguranças, em que a aprovação do outro é muito importante, sua aceitação social é considerada de uma forma essencial que em outras fases da vida jamais será. Na juventude, mais do que em qualquer outro momento da vida, é importante se sentir aceito, e mais do que isso, se sentir querido.

    Nesse contexto, é bem isso que o número de curtidas vem “medir”, e é aí que causa problemas - não só para jovens, já que todas as pessoas de um modo ou outro se afetam ao saberem-se mais ou menos queridas, mas principalmente para eles, já que a sabedoria de genuinamente não ligar para sua “popularidade" não chegou ainda, e a confiança em si mesmo, não nascente no respaldo e na confiança atribuída de outrem em você, também não.

    Pois, se um jovem recebe muitas curtidas e bons comentários numa foto postada de si mesmo, em que se produziu todo e está mostrando destacadamente os contornos de seu trabalhado corpo, então ele está em forma, sua imagem corporal é bem cotada. Se uma jovem compartilha uma certa frase estupendamente boba que achou interessante, e igualmente tem considerável número de joinhas, ela imediatamente conclui que é maneira, é aceita, está integrada a um círculo extenso de pessoas. Se, por outro lado, alguém está em um dia ruim, cinzento e triste, e abre sua página em alguma dessas plataformas, e vê que tem 6 seguidores, enquanto um outro conhecido tem 120, então mais ainda ela acaba de se deprimir.

    A comparação é clara e é cruel. A mensagem que se comunica e interioriza, nesse caso, é a seguinte: ele é muito mais interessante do que você, literalmente 20 vezes mais querido do que você - mesmo que seja alguém de capacidade intelectual e sensitiva pobre e reduzida e tenha muito pouco a falar por si mesmo, e que você seja alguém imensuravelmente mais culto, mais perspicaz, mais sensível. Assim, o efeito dessa comparação, tão explícita, por números, pode ter efeito devastador em quem está frágil naquele instante, ou em quem já tem uma instabilidade emocional marcante.
     (Entendam, não estou sendo radical aqui. Não estou dizendo que ninguém deve curtir mais nada, e deve abolir o uso do "gostei" e "desgostei". Só estou propondo uma reflexão em como pautamo-nos nesses números para formar primeira ligação com alguma coisa ou alguém, e como eles podem afetar quem não os considera com moderação.)

    Em suma, respondendo a pergunta que fiz logo no início, a curtida é um problema porque traz a quantificação nítida, clara e pública de seu nível de “aprovação” social, que antes não poderia ser “medida” dessa precisa forma. Traz a quantificação muito errônea, aliás, de algo que não pode ser quantificado, e é um valor que está mais para ser avaliado na qualidade do que na quantidade. Traz a possibilidade de uma comparação que muitas vezes não traduz a realidade, e é baseada em parâmetros que podem ser relativizados: nós associamos popularidade a qualidade; aquilo que tem um grande número de aprovações, portanto, deve ser bom. Como se essa relação pudesse ser feita, como se ela sempre pudesse se provar verdadeira.
   

sábado, 4 de julho de 2015

Embalos de sábado à noite

     Alô, galera!

   Pensando em dar uma diversificada aqui no blog, topei com essa ideia. Aos sábados, postarei algo mais leve, uma bocada no universo cultural tão variado que nos rodeia. Ao mesmo tempo, como boa historiadora novata que sou, esse quadro será uma declaração de amor à História. Pois, a História é a arte do contexto, e aqui eu vou exercitá-la. Junto com o vídeo, a música, a produção que eu escolher para o dia, colocarei também um pouquinho do seu enredor, o pano de fundo que é sempre interessante conhecer, até para melhor conhecer e entender a obra.
     Espero mesmo que gostem; e sugestões e comentários são sempre bem-vindos!

     E para começar, dois clássicos da era do disco, parte da trilha sonora do filme que dá nome ao quadro.
                                                                  
            
 
                                                           
                                                              

    "Stayin' alive" e "You should be dancing" são canções da banda Bee Gees, ícone de seu tempo, conhecida até hoje por ter nos dado alguns dos mais marcantes hits da discoteca.   
     Elas dão não só o tom do filme, como também de sua época: a juventude norte-americana do final dos anos 70 estava perdida. A recessão em que o país se encontrava gerava desemprego e insegurança; a vergonha da Guerra do Vietnã era incômodo recente no brio das pessoas; os ventos da cultura hippie sopravam fortes, questionando a guerra, pregando sexo livre e uso de drogas como elementos de liberdade. Muitos jovens mergulhavam nos dois, e na dança, como forma de escape às durezas de sua realidade e ao desnorteamento quase existencial que viviam.

     Tony Manero, o protagonista do filme, encarna tudo isso em seu personagem, vive toda essa história, e é curioso perceber como, com todas as adversidades, é na dança que ele se encontra.
     Entre outros, esses são alguns aspectos do cenário em que o filme e suas músicas se situam. Pontos dos quais, numa primeira vista e ouvida, às vezes nem nos damos conta - porque também envolvidos nessa batida que é uma delícia!
    

quarta-feira, 1 de julho de 2015

A beleza da sinceridade

                                                                    

   Se existe uma qualidade que está em falta é esta. Sinceridade. F-R-A-N-Q-U-E-Z-A. Nosso mundo vive uma escassez grave desse atributo, uma falta epidêmica dele. Pouquíssimas pessoas parecem ter a capacidade de falar simplesmente o que estão sentindo e querem falar num certo instante, com relação a alguma situação ou alguém. Nós, brasileiros, particularmente, temos o péssimo hábito de cultivar uma falsa polidez calada que fala bem menos do que devia, exatamente quando deveria. Nos momentos ruins ou bons, quando alguém está pedindo para ouvir umas verdades ou merece ouvir elogios e saber como é admirada, nós nos calamos. Engolimos o que queríamos xingar, ou silenciamos o que queríamos de bom expressar.

    Por insegurança, por medo, por falta de costume em manejar bem as palavras justamente no instante em que elas são mais precisadas, por bem ou por mal, nós nos calamos. Quando alguém fura a fila descaradamente na sua frente, ou quando outro alguém fala algo muito bonito, muito belamente, algo com que você consegue se identificar plenamente porque também pensa ou sente assim, nós somos contidos. Se dizemos qualquer coisa, é tão pouco, tão mais tímida e levemente do que realmente queríamos dizer, que chega a ser bem como se não tivéssemos dito nada.

    E isso incomoda. Essa raridade de algo tão necessário impressiona negativamente, e talvez seja por ela que ficamos admirados tão facilmente com uma demonstração simples de straightforward, direta, franca e aberta fala. Eu, particularmente, para ser sincera, sinto muita falta de preto no branco, de ouvir o que as pessoas de fato pensam e sentem num momento, e percebe-se que não estão dizendo. Sinto falta de saber o que está acontecendo numa certa situação em que claramente algo muito sério está acontecendo mas nada é dito, nada é esclarecido e os envolvidos lidam veladamente com o problema, sem nenhuma confrontação ou ato de pôr as cartas na mesa, − ou não lidam, de modo algum, fingindo que nada está acontecendo.

    Assim, eu francamente não consigo desgostar de pessoas que são naturalmente supersinceras, como o nosso caro Dr. House, a Dowager Countess de Downton Abbey, ou a Santana de Glee, só para dar alguns exemplos. Pessoas que dizem exatamente tudo o que pensam, sem rodeios ou suavidade, não raro abobalhando a todos com sua ironia, essa generosa ferramenta de linguagem que, no fim, é tão somente um brilhante instrumento de dizer, francamente, a verdade, todas as verdades (algumas das quais, inclusive, bastante cruéis). Pois, realmente, a gente fala tanto do que não sente de verdade e deixa calar tanto do que realmente sente que isso não pode ser saudável − tanto para cada um, individualmente, lá dentro, quanto em nossas relações, de todas as naturezas. E quem possui o dom e a coragem de fazer o contrário, ah, essa pessoa brilha, e com certeza está um passo a frente de todos nós em quesito de saúde da alma e das suas convivências.

    Em suma, o que eu queria dizer hoje era isto: estamos carecendo de sinceridade! É claro que há certa magia na sutileza, na entrelinha, certo encanto na maciez de falas e maneiras, na habilidade de comunicar o que quer dizer sem a voz, subentendidamente. E também há certa absurda e desnecessária rudeza em verdades que talvez não precisavam ser ditas. Mas, existe uma beleza inextinguível na sinceridade, essa qualidade que parece estar ameaçada de extinção e que, se bem dosada, não faz mal a ninguém. De verdade. Pelo contrário - como raios teimosos que descem à terra de um sol tampado insistentemente por nuvens negras, ela é bela, brilhante, radiante. E como nós precisamos dessa luz, desse brilho!