quarta-feira, 23 de março de 2016

O norte que escolhemos para nós

                                                                   

    Pela manhã, se estendermos o braço direito voltado ao sol, teremos o norte geográfico a nossa frente. A rosa dos ventos não muda conforme sopra a brisa, é fixa, de fácil compreensão pela observação dos astros em nosso enredor.
   
    Contudo, há um outro norte tocante a cada um de nós que não é de tão simples e imediata apreensão, percepção. É o norte que guia a existência, o caminho de cada dia, todos os atos e todas as omissões, todas as escolhas e todas as renúncias. O norte para onde vai nosso olhar quando caminhamos, nosso coração quando pensamos, para onde vaga nossa mente quando os olhos se fecham e dormem.
   
    Para descobrir esse norte, não basta olhar para o céu e direcionar os braços. É preciso fazer exercício é bem mais difícil: é preciso olhar para si. Quem é estrangeiro no território de si mesmo, com certeza não saberá demarcar-se norte, nem identificar e assim trilhar caminhos que apontem para ele. Quem tem medo de adentrar suas próprias fronteiras para conhecer seu interior, não pode esperar localizar-se e orientar-se bem em rota alguma.

    Pois, o norte de cada um de nós a que aqui me refiro não se encontra lá fora. Ele se encontra dentro de cada um de nós. Ele é fruto de nossas vivências e personalidade, de parâmetros que fazemos para nós mesmos, e não são dados, ditados a nós por outrem. Cada um de nós tem o poder de criar seu próprio norte, de escolher seu próprio norte, de acordo com a pessoa que é e com a pessoa que quer se tornar, de acordo com os valores que cultiva, com as prioridades que carrega, com as experiências que deseja ter ou evitar.
   
    Dentre os mais comuns possíveis nortes, creio que os mais perigosos são aqueles, justamente, que determinam-se por outras pessoas. Quem tem por seu norte, por exemplo, aclamação social, tem no seu sol a opinião das outras pessoas. (Como são muitas as pessoas com esse norte!) Tudo o que faz, o faz para agradar alguém, e é assim, no próprio ato, tolhido em sua essência e originalidade pela expectativa alheia. A consideração que tem de si mesmo, a sua autoestima, sua confiança é determinada pela consideração de terceiros, pelo instável termômetro da opinião dos outros. Seu norte o torna refém de algo que não pode controlar, algo que tem concepções indefinidas e coerência questionável, para dizer o mínimo.

    Quem tem por norte algo vazio dessa forma, perde-se de si mesmo. Ou melhor, anula sua própria existência. O seu “eu”, sua particularidade, sua identidade única e especial deixa de existir. Em semelhante situação está aquele que abstém-se de escolher seu norte, e se deixa ser guiado pelo fluxo. Aquele que voa acompanhando o bando, que veleja - aliás, flutua, à deriva - ao sabor da correnteza. Este abdica da autoria de sua própria história, declara-se voluntariamente desorientado, seguidor de um norte tão movediço e inconstante quanto são os caminhos pelos quais perambula.
   
    Quem dera fosse tão fácil a percepção dos sentidos fundamentais de nossa vida quanto é a percepção daqueles do horizonte. Não é. Contudo, é uma percepção que temos de fazer, uma conclusão - seja ela qual for - a que temos que chegar. Afinal, a vida não é mais que uma estrada, na qual precisamos de orientação para caminharmos. E quanto mais sabiamente apontarmos nossa direção, e mais firmemente tenhamos ela mente, mais decididos serão nossos passos, mais feliz será nosso caminhar.
                                                              

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