quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Exceção

                                                                    

    Todos querem preto, eu quero branco
    Todos querem confuso listrado
    Eu quero sem estampa
    Eu escrevo sem maquiagem,
    como vivo

    Metade é do azul, metade é do vermelho
    Ferrenhamente, como tigres em duelo
    Entre os dois, estou eu, quase só
    A levantar a bandeira verde, a bandeira branca
    Sem entender
    Porque não parece haver mais gente
    que gosta dessas cores
    ou de lilás

    Todos querem telas, eu quero páginas
    Quero lápis, grafite
    Quero cheiro, textura, novidade ou velhice,
    branca ou amarelada
    pálida ou coradinha
    em papiro ou em pedaços
    Eu quero beijos e abraços, quero olhos,
    quero riso, quero toque e conversas
    Eu quero dançar a vida no seu palco principal
    Não consigo me conformar ao ver que tanta gente
    prefere o palco suplente
    Acessório, indireto
    O dublê

    Todos querem ^, cê, vc.
    Eu quero você.
    Vosmecê, vossa mercê, você. V-O-C-Ê
    Quero você por inteiro
    Nítido e claro, risonho e límpido
    Soletrado, e deliciosamente demorado.
    Num beijo heróico, dado retumbante
    O tempo que for necessário
    para ser completo
    Eu sou meio do contra
    Não gosto de abreviações

    Todos querem cobertas demais.
    Cobertas, almofadas, xales, lenços,
    travesseiros empilhados, ar condicionado
    Eu quero sobre mim somente o manto do céu
    Não entendo porque mais gente
    Não entende a liberdade nisso
    Não quer a liberdade disso

    Todos querem demais ornamentos
    Todos querem ornamentos demais
    Eu não quero ornamento
    Fruru, decorado, enfeite, gracinha,
    penduricalho, balangandã
    Eu não quero ornamento nenhum
    E uso inclusive um pleonasmo para sublinhá-lo

    O único ornamento que eu quero
    É o que todos querem fazer despir
    Simplificar, empobrecer, empodrecer,
    sintetizar, mediocrizar
    enxugar
    Eu quero o ornamento
    Da língua
    Da saliva quente
    Da voz ardente
    Do silêncio insolente
    Da palavra atrevida
    Ah, palavra!

    Quero ornamento da língua
    Da língua múltipla,
    Da linguagem diversa
    Da cantoria
    poetizada, poemimada
    Do idioma dançado
    Carnavalizado
    Metamorfoseado
    Batucado ou soprado
    Em novo arranjo
    Guitarra não elétrica
    Humana

    Eu pareço querer tudo ao contrário.
    O mundo está doido,
    Colônia
    Eu não.
    Eu sou perfeitamente sã
    Barbacena!

    É difícil, é custoso
    É doído, é uma peleja
    Mas tenho que me acostumar a ser
    O que sempre fui
    Exceção
   

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