quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Desligando: uma experiência de sociabilidade

                                                                             

    Dia desses, uma percepção atingiu-me arrabatadoramente. O senhor leitor pode surpreender-se com o quão óbvia ela é. Mas eu diria que sua obviedade é parte fundamental do pânico que me causou.
   
    Atentei, num desses clarões de entendimento que nos chegam sem convite ou aviso e nos deixam atarantados, para o tanto de perguntas que eu fazia quase diariamente às ferramentas de busca na internet nas várias telas ao meu redor. Que horas passaria o ônibus para tal lugar, ou que direção eu precisava tomar para chegar em outro a pé. A previsão do tempo para aquele dia, os recintos da cidade em que procurar por tal produto ou tal serviço, a avaliação maioritária do estabelecimento que abriu mês assado. A recomendação de um livro para ler agora, um CD para embalar meu tranquilo final de semana.
   
    Ora, não são essas todas perguntas que eu poderia fazer para pessoas ao meu redor? Gente de verdade, de carne e osso, que me responderia com um sorriso surpreso à indagação ou uma voz alegre, que contorceria o rosto em concentração para pensar numa resposta e seria tímido e medroso, que me daria um gentil aceno de cabeça em retornou ao meu agradecimento e ficaria contente por ter tido a chance de ser útil a alguém.
   
    Perturbada por essa percepção e por pensar no que eu estava perdendo substituindo pessoas por telas, resolvi emendar-me. Fiz o experimento em um inteiro marcante dia de abordar pessoas - que estavam aos montes em minha volta naquela fervilhante segunda-feira - para fazer-lhes quaisquer perguntas que me ocorressem ao invés de buscá-las na internet.
   
    Foi uma experiência mais que adorável. Abordei várias pessoas ao longo do dia, em diferentes lugares, escolhendo sempre aquelas que mais abertas se mostravam ao contato. Sem fones de ouvido ou sequestradores similares de atenção, sem expressão grave ou emburrada ou compenetrada, sem aquela pressa maníaca que não raro adoenta gentes por aí. Abordei completos desconhecidos, sempre tentando aliar certo grau de polidez à conversa casual.
   
    Com algumas pessoas, a conversa fluiu para além da inicial indagação. Descobrimo-nos vizinhos e compartilhando opiniões e gostos, trocamos contatos. Com outras, a interação cessou com a resposta ao perguntado, talvez por reserva ou timidez, talvez por uma incompatibilidade natural mesmo, sentida pela poderosa via da intuição no muito breve átimo que precisamos para percebê-lo.
   
    Ora fui recebida com muito calor e admirada curiosidade, ora com receio e distância, ora com franca e indisfarçada estranheza pela ousadia. Algumas vezes, fiquei até estonteada pelas tantas sugestões e possibilidades  oferecidas à minha inocente interrogação. Noutras, a pessoa também não sabia o que eu perguntava e recorria ao recurso virtual. Nessas ocasiões, eu procurava enxergar a positividade da coisa: estávamos interagindo no plano real da existência e juntos fazendo passeio pelo plano virtual, mirando a mesma tela.

    Se a percepção que me agonizou e provocou-me a este experimento também se verifica em você que me lê, recomendo que tente fazer algo parecido. Nem que seja só por um dia. Você pode se surpreender com a receptividade das pessoas e descobrir que abordá-las e conhecê-las é muito mais fácil que difícil, muito mais gostoso que custoso. Basta deixar de lado a internet um pouquinho e tomar a iniciativa da abordagem, de preferência portando um sorriso como cartão de visita. Basta dar o primeiro passo.

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