quarta-feira, 4 de maio de 2016

Em busca de silêncio

     
    Silêncio.
   
    Ouviu? Está ouvindo?

    Silêncio. É uma palavra bonita, que crisma um belo som. Um som lindo e raro.

    Raro numa medida extrema que talvez não deveria. Quantas vezes a gente ouve, realmente ouve o silêncio? O som do silêncio, do nosso silêncio? Quantas vezes, silenciando tudo, todo o resto, desligando a cacofonia do lá fora, a gente se ouve? No nosso silêncio, quantas vezes a gente ouve os nossos barulhos - até que eles se tornem sons?
   
    Poucas, eu acredito. Pouquíssimas. Poucas demais para nosso próprio bem. Porque o caos nos envolve e nos engole. Porque tantas são as exigências, as tarefas que temos que cumprir, as coisas de que temos que dar conta, tantas são as gentes - as gentes, em sua mor parte, tão barulhentas - que nos rodeiam, o tempo todo... Quase ninguém consegue passar um bom tempo sozinho, a sós consigo, com seu íntimo.

    E, não raro, quando conseguimos, quando enfim temos um ínfimo tempinho para nós, quietinhos com nossa própria companhia, que fazemos? Ligamos o tal do celular e nos conectamos... Com um monte de coisas e um monte de gentes tão acessórias se comparadas à nossa essência... Nos conectamos com o mundo inteiro e nos desconectamos... de nós mesmos.

    Precisamos reestabelecer esse contato. Precisamos de silêncio, de um silêncio tão silencioso e tão particular que nos faça ouvir o nosso coração. Isto no sentido figurado, de atender os nossos anseios e desejos, de atender aos chamados do nosso eu interior (de vozinha tão suave e tímida perto da estrondosa barulheira do exterior mundano), e no sentido literal também. No sentido de ficarmos tão quietinhos, mas tão quietinhos, e tão em paz, que possamos tomar consciência completa de nosso corpo por uns instantes e nos deixemos inundar por essa consciência, ouvindo somente as batidas do coração, sentindo a vibração do pulso, o caminhar da vida circulando em nós, vermelha.

    Precisamos reestabelecer esse contato com nosso interior, esse diálogo viabilizado pela linda sinfonia do silêncio, porque a falta dele nos deixa ansiosos, nos paralisa, nos desencontra. Deixa-nos perdidos e bagunçados, apressados numa corrida cambaleante e sem rumo.

    Ao dizermos “sim” ao mundo inteiro, dizemos “não” para nós mesmos. Nos distanciamos de nós mesmos, nos desencontramos de nossa essência, já não sabemos quem somos. Se somos. Assim, quando perguntados, não sabemos vocalizar nossos sonhos ou nomear nossos maiores desejos, ou medos, porque não sabemos quais são. Não os conhecemos, porque não nos conhecemos. Nunca paramos para pensar ou, mais do que isso, nunca paramos para sentir. Nunca paramos, a bem da verdade, para (nos) ouvir.

    Precisamos de silêncio. Precisamos das energias e das ondas do silêncio para nos sintonizarmos na estação de nós mesmos. Precisamos diminuir o volume do mundo em nós, minimizar as interferências vindas do lá fora, do excesso de informação, da sobreposição desorquestrada de barulhos para sentirmos os nossos sinais. Captarmos o melhor sinal de nós mesmos, ouvirmos nossos próprios sons, os sons de nosso âmago. Para que entremos em harmonia com a melodiosa voz do nosso silêncio.
   
    “Ei, psiu!”

    Ouviu agora? Está ouvindo? Está sentindo?

    O seu silêncio está aí. Esperando, chamando, cutucando.
   
    Basta parar para ouvi-lo.
   

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